Ainda é cedo para falar em "clássico" ou em "revolução", mas Duas cidades, novo disco da Baiana System, já pode ser considerado o principal álbum da música da Bahia lançado nos últimos anos. Quem vê vídeos de performances do grupo no carnaval de Salvador em 2016 pode confirmar que aquele som é poderoso e já provou que tem um amplo alcance, além de esbanjar originalidade. Todas as faixas estão disponíveis para audição no Deezer e a partir do dia 8 de abril serão lançadas em outras plataformas, como Spotify, iTunes, Apple Music e YouTube. A data de lançamento do CD físico ainda não foi confirmada.
A Baiana System diferencia-se por conseguir sintetizar a pluralidade da cultura de Salvador sem separações ou rivalidades preconceituosas. No som do grupo, é possível identificar influências internacionais de hip hop, rock e reggae (dub, ragga, dancehall), mas também referências diretas da música soteropolitana, como o samba-reggae, a percussão tribal e a "guitarra baiana".
Os convidados que colaboram nas faixas ilustram essa quebra de barreiras. Entre os percussionistas participantes estão Márcio Victor (da banda Psirico, cantor do sucesso Lepo Lepo) e Japa (da Timbalada). O pernambucano Siba toca rabeca na música instrumental Cigano (com um clima de Academia da Berlinda). O guitarrista argentino Mintcho Garrammone colabora com a cúmbia Lucro (Descomprimindo). O samba de roda é representado pelas vozes das Ganhadeiras de Itapuã no coro da canção Panela. A produção é do tecladista paulistano Daniel Ganja Man, que recentemente dirigiu o show em homenagem a Tim Maia ao lado de Ivete Sangalo e Criolo.
Tocada por Roberto Barreto, que já foi guitarrista da Timbalada, a "guitarra baiana" é um dos principais eixos da sonoridade do Baiana System. O instrumento musical é uma espécie de bandolim elétrico ou uma miniatura da guitarra elétrica (está para a guitarra assim como o cavaquinho está para o violão), mas também se refere a uma forma de tocar e a toda uma estética tropical desenvolvida por músicos como Dodô, Osmar, Armandinho, Luiz Caldas e Pepeu Gomes. Esse resgate demonstra que a nova geração da música baiana não nega o próprio passado cultural. A presença dos metais também evoca a energia carnavcalesca. Quando tocou no carnaval do Recife em 2011, no festival Rec Beat, a Baiana System foi classificada por um jornalista como uma banda de "axé experimental". A guitarra baiana, por sinal, também sempre foi bastante utilizada nos frevos criados para o formato de trio elétrico.
O vocalista da Baiana System é Russo Passapusso, que já lançou um disco solo e também participa do grupo Bemba Trio. Tanto na forma de falar quanto no jeito contagiante de cantar e comandar o público com gestualidade, ele revela-se um líder nato, com um carisma que lembra Chico Science.
Com letras recheadas de posicionamentos políticos, ironia e reflexões urbanísticas, mas também ricas em gírias e sugestões de imagens do cotidiano popular, as canções transmitem sentimentos de alegria, com o espírito de festa como prioridade, em uma reafirmação de como uma coisa não impede a outra. É entretenimento com alto teor crítico.
A Baiana System já havia lançado um disco independente, mas Duas cidades foi gravado com uma produção mais elaborada e deve fazer a banda estourar nacionalmente. Em Salvador, o crescente sucesso do grupo já virou polêmica, pois parte do público que os segue desde o início da carreira já começou a estranhar a quantidade (e a diversidade) de gente presente nos shows, realizados em locais cada vez maiores (alguns com ingressos mais caros). A banda, entretanto, nunca traiu as raízes e tem procurado conciliar diferentes formatos de apresentação.
Mais do que uma banda, a Baiana System representa um fenômeno de reformulação de comportamentos em uma cidade onde a axé music encontra-se em crise de valores e cada vez mais restrita ao período do carnaval.
fONTE> http://www.diariodepernambuco.com.br/app/noticia/viver/2016/03/30/internas_viver,635691/musica-de-salvador-ganha-novos-horizontes-com-disco-da-banda-baiana-sy.shtml
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